Os brasileiros estão acostumando-se com o tamanho da corrupção no país e a falta de compromisso dos deputados e senadores com a moral e a ética. Em um país sério, com políticos que tem um pouco de respeito com os eleitores, não aconteceria o que houve na última quarta-feira. Numa sessão extraordinária, os parlamentares encontraram uma maneira de livrar a cara de um deputado corrupto, que havia sido suspenso pelo Supremo Tribunal Federal. Denunciado por corrupção, Wilson Santiago deveria ser afastado também pela Câmara dos Deputados. Os seus pares deveriam ter o cuidado de zelar por suas imagens, mas preferiram manter o colega no cargo. Conforme o STF, o afastamento desse deputado era algo necessário, pois, nas palavras do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, Santiago transformou o seu cargo em uma agenda criminosa.
E qual foi a justificativa dos parlamentares para manterem esse político no cargo, mesmo que ele esteja a serviço de uma agenda criminosa? A balela de sempre de que o Supremo Tribunal Federal não pode interferir no funcionamento de outros poderes da república. Isso é realmente uma vergonha. Então o cara pode cometer o crime que quiser, utilizando-se de seu cargo como parlamentar, e não sofrer as consequências de seus crimes apenas em função de um corporativismo sem vergonha nem pudor?
O deputado só poderia ser afastado se pelo menos 257 parlamentares votassem pela manutenção da decisão do STF, mas apenas 170 dos 513 deputados demonstraram algum compromisso com a sociedade. Isso quer dizer que mais de 66% dos parlamentares apoiam corruptos, o que nos leva a acreditar que também são corruptos. Quem apoia criminoso é cúmplice dele, certamente.
Para espanto da nação, 255 deputados votaram a favor do colega corrupto, sete deles se abstiveram e 102 fugiram do plenário. O presidente, Rodrigo Maia, tem o benefício da dúvida, pois não precisa votar.
Apenas 35,1% dos deputados demonstraram algum compromisso com a moralidade. A desfaçatez atinge quase 70% do parlamento. Eles livraram o parceiro, mesmo pesando contra ele provas robustas como vídeos e áudios. O deputado foi acusado de ser beneficiário de propina provenientes de obras no nordeste brasileiro. O negócio de quase 25 milhões, há suspeitas de desvios de mais de um milhão de reais.
Poucos deputados discursaram na sessão. Os poucos que o fizeram, não ousaram defender Wilson Santiago. Ele próprio preferiu não falar. Não havia muita coisa a ser dita. Bem que o presidente da Câmara lhe ofereceu o microfone, mas ele, claro, recusou-se. Ele sabia que dependia da generosidade dos deputados. Sabia que, se o parlamento usasse o bom senso, não haveria salvação para si. Mas contou com a generosidade dos colegas. Nem teve de implorar ou se esforçar para isso. Muitos parlamentares são solidários com colegas corruptos, pois estão em situação similar e um dia ou outro terão de se explicar na justiça.
Os brasileiros não podem contar mesmo com os deputados para moralizar a política no país. O plenário está repleto de investigados e é por isso que eles vêm com essa lorota de independência dos poderes. Sim, em um país moderno, os poderes precisam ser independentes e harmônicos entre si, mas é preciso que as instituições funcionem como freios e contrapeso. O Supremo Tribunal Federal não pode intervir em outros poderes em situações de absoluta normalidade, mas em casos de corrupção, deveria intervir sim, pois existe uma legislação que, no papel, indica que corruptos precisam sofrer sanções legais.
Ao povo brasileiro só cabe a revolta, pois entra ano e sai ano sem uma solução. Todo mundo que entra para a política promete agir com decência e respeito ao erário público. Mas depois eleitos, mudam o comportamento. Está difícil. Muito difícil. Essa decisão de quarta-feira é apenas mais uma das tantas barbaridades cometidas por nosso parlamento.