Parem as máquinas!
Nós que amamos este jornal por décadas, hoje pranteamos com Adair Perin o encerramento de um ciclo histórico na imprensa do interior rondoniense. Tribuna Popular, o “descolorido” encerra a edição impressa que desnudou com agruras e alegrias a vida pulsante de Cacoal.
Em abril de 2016, o editor executivo Martin Baron, do jornal The Washington Post, reuniu engenheiros e repórteres para trabalhar lado a lado na criação de “experiências digitais”. O bom é que o influente Post segue vivo na Capital norte-americana.
Dessa tendência de encerrar o uso do papel não escapam os mais importantes jornais do mundo. A hora de cada um chegará, muitos aceitaram ingressar rapidamente no mundo digital, outros ainda estudam forma e conteúdo.
No cômputo geral, o que somos diante desses novos tempos, senão simulacros ou sombras daqueles repórteres que se encostavam no balcão de botecos e restaurantes, visitávamos glebas, cafezais, terras indígenas, gabinetes executivos e plenários comerciais ou legislativos, com o único objetivo de ver, perguntar e ouvir?
Assim foi longo tempo esse bravo Perin, um homem pacífico, mas enérgico quando precisou sê-lo; patrão que prestigiou gráficos, editores, repórteres, jornaleiros, e assim fez crescer em si próprio a aura de cidadão partícipe da história de Cacoal.
Quantas vezes os leitores desse jornal viram Perin comemorar uma simples nota da seção Boca Maldita; quantas vezes o vimos feliz em comemorar vitórias políticas, ambientais, indígenas, agrícolas, policiais, estudantis e socioeconômicas, para as quais muito contribuiu?
Entre outros que procuravam sua gráfica, o extinto jornal O Garimpeiro foi ali composto e impresso semanalmente para em seguida chegar às dragas, balsas, barrancos e lojas de ouro naqueles inesquecíveis 1985-1986.
Durante os 41 anos de vida impressa, certezas e incertezas caminharam juntas no vibrante jornal desse corajoso catarinense que desembarcou no velho território federal no meio de levas migratórias que engrandecem esta chamada Terra de Rondon.
Certeza de ter no estoque resmas de papel suficientes das empresas Samab e da T. Janer, encomendadas com antecedência de meses, para garantir a regularidade das edições. Incertezas de receber em dia anúncios particulares e publicidades institucionais que também lhe garantiram o rigoroso e estatutário pagamento de contas, todas.
Você caminhou na estrada da vida e, antes do offset, fez os visitantes ouvirem o barulho das velhas linotipos compondo textos; o cheiro da tinta da velha impressora e do chumbo quente das caldeirinhas; o telex transmitindo e recebendo notícias.
Ah! Perin, quanta falta irão fazer os seus leitores folheando prazerosamente a Tribuna na esquina, em casa, em estabelecimentos comerciais, escolas, gabinetes políticos, por toda parte, para acompanhar a vida desta cidade e de todos os rincões do estado.
Certamente, se lhe perguntassem e o Tempo Rei lhe permitisse fazer tudo de novo, de sua boca sairia um “sim” com muito gosto.
Seu jornal cobrou decisões, fez reivindicações, analisou a política e escreveu histórias, amigo. Elas repercutiram dentro do município, na Capital, noutras regiões do estado e na Capital Federal.
Aqui ao meu lado, se solidarizando com a sua marca no tempo de tantas glórias, o jornalista Cleuber Rodrigues lhe envia um abraço. Mais abraços chegarão a você, dados agora virtualmente pelos também discípulos do impresso, Carlos Araújo, Carlos Henrique Ângelo, Carlos Sperança, Lúcio Albuquerque, Cleiton Pena, Osmar Silva, Nonato Cruz, Nonato Neves, e outros “gatos pingados” remanescentes de um jornalismo tão vibrante a serviço de Rondônia.
Que estes espasmos eletrônicos – como diria o saudoso jornalista Paulo Queiroz – também possam traduzir a nossa esperança nas atuais gerações profissionais. Elas não foram batizadas no chumbo quente, porém, aprenderam a receita prática e o ritual diário no palco digital, com igual performance e resultados eficazes para o jornalismo.
Giliane Perin, desfralde essa bandeira. E sinta-se feliz por ter sido, por um luminoso tempo, artífice do impresso que deixa saudades.
*Montezuma Cruz trabalhou em Rondônia para o Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo, O Globo, e para os extintos: A Tribuna, O Guaporé, O Parceleiro e O Imparcial. Colaborou com a Tribuna Popular e Alto Madeira. Acompanhou a transição entre o antigo território federal e o novo estado. Atualmente é repórter da Secom, do Governo de Rondônia.