Coluna O Briefing – Diplomas à venda, empregos em falta – a crise da Geração Z com os diplomas inúteis

Por Maycon Klippel – Da sacola plástica às redes sociais, quase tudo virou global. Inclusive o desemprego jovem embalado em diploma caro. Se na Índia pequenos prédios se transformam em “universidades” que prometem engenharia em troca de US$ 4 mil, no Brasil outdoors virtuais vendem MBAs relâmpago em marketing digital por R$ 149 ao mês. O resultado atravessa fronteiras: milhões de formados que colecionam certificados, não contracheques.

 

1. O subprime educacional indiano  

A reportagem da Bloomberg reproduzida em O Globo descreve o paradoxo: a economia que mais cresce no mundo exibe 7% de desemprego estrutural porque metade dos graduados não serve às vagas existentes. Dos engenheiros, só 3,8% dominam software suficiente para startups. Tanmay Mandal, 25 anos, pagou um curso de engenharia civil equivalente a dez anos da renda familiar e continua ocioso. A explosão de faculdades de garagem, sem laboratórios nem professores preparados, criou uma bolha de diplomas que não cabem nos canteiros de obras — nem nos data centers.

 

2. Brasil: 10,3 milhões de “nem-nem” não se resolvem com apostila colorida

Os números compilados pela Brasil Paralelo via IBGE espelham o retrato indiano: 21,3% dos jovens entre 15 e 29 anos não estudam nem trabalham. Somos vice-líderes globais em “nem-nem”, atrás apenas da África do Sul. A velha crença de que “qualquer faculdade garante vaga” convive com outro dado do IBGE: graduados ainda ganham 56,2% mais que quem parou no ensino médio. Contradição? Nem tanto. O bônus salarial se concentra em cursos com aderência industrial — enfermagem, TI, agronegócio. Do outro lado, formações genéricas despejam egressos em filas do LinkedIn que se alongam mês a mês.

 

3. O mesmo eco em Manhattan e Manchester  

A matéria da Fortune citada pelo InfoMoney mostra 4,3 milhões de Gen Z americanos entregues à categoria NEET, enquanto o Reino Unido engordou em cem mil seus jovens sem ocupação em apenas um ano. Fala-se em resumir o fiasco à “falta de resiliência” da geração. Bobagem. O gargalo está no conteúdo: currículos que ignoram automação, energia verde e análise de dados, áreas que mais contratam.

 

4. De onde veio a dissonância?  

• Fetiche social: na Índia, um diploma ainda decide até casamento; no Brasil, títulos decoram bio de rede social. Esse prestígio cultural garante demanda cega.

• As fintechs do ensino: faculdades low-cost replicaram o modelo fast-fashion — volume acima de qualidade — financiadas por crédito estudantil farto.

• Miopia regulatória: agências avaliadoras monitoram carga horária, não empregabilidade. Abrem-se cursos, fecham-se oportunidades.

 

5. A conta que não fecha — ou fecha tarde demais  

O retorno médio de 681 % em 40 anos para um diploma, citado nas três reportagens, é real, mas funciona como promessa de previdência privada: dilui-se no tempo, nos juros do FIES, no aluguel e nas chances de a tecnologia aposentar seu ofício antes de quitar o boleto.

 

6. Como sair da armadilha  

a) Empregabilidade na vitrine: publicar, por lei, salário médio e taxa de primeiro emprego de cada curso nos 12 meses após a formatura. Quem ensina, presta contas.

b) Trilhas dual track: metade das disciplinas ancorada em projetos com empresas, metade em teoria. Modelo alemão, custo brasileiro.

c) Financiamento inteligente: crédito estudantil indexado à renda e liberado só para cursos com ROI comprovado.

d) Pontes de curto ciclo: microcredenciais em IA, energia solar, manutenção industrial integradas ao currículo — válidas inclusive para recalibrar bacharéis já formados.

 

Conclusão

Quando diplomas viram commodity, conhecimento deixa de ser capital e vira entulho invejoso no currículo. De Nova Délhi a Natal, a Geração Z carrega o mesmo peso: pagar por promessas que não cabem no mercado real. A solução não é demonizar a universidade, mas arrancá-la do pedestal de boutique e devolvê-la à oficina do mundo. Enquanto não fizermos isso, continuaremos formando engenheiros que nunca levantaram um pilar e comunicólogos que não sabem medir KPI — artesãos do próprio desemprego.

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