Por Franscisco Xavier Gomes
CACOAL: A CULTURA, A MORAL E A PIPOKINHA…
A população de Cacoal tem se revelado, nos últimos anos, como um dos principais polos rondonienses do chamado “conservadorismo” deste século. E, sem exageros, não é difícil afirmar que Nossa Urbe Obediana está entre os polos mais rígidos do conservadorismo no país. Também é verdade que muitos desses valores tão defendidos nas redes sociais da cidade não vão além de barulho nas redes. A prática e o cotidiano obediano, inúmeras vezes, é bem diferente. Agora, no momento em que a cidade se prepara para receber com muito carinho uma tal MC Pipokinha, teremos mais uma oportunidade para constatar os valores morais e culturais da população. Esses valores já foram colocados à prova em diversas ocasiões, sobre temas diversos, e ficou evidente uma certa fragilidade nos costumes, embora a concepção de cultura tenha sido usada como pretexto em todas essas ocasiões. Pipokinha vem para colocar, mais uma vez, a cultura, o conservadorismo e a moral obediana em teste. Aliás, Cacoal já recebeu e venerou diversas outras pipokinhas…
Inicialmente, quero esclarecer que considero essa senhora um espetáculo abominável de baixaria e obtusidade, mas não estou na lista dos conservadores da cidade. A questão é que, no campo musical, fui criado ouvindo Djavan, Roupa Nova, Padre Zezinho, Milionário e José Rico, Chico Buarque, Cascatinha e Inhana, Cidinho e Doca, MC Malboro, Tim Maia, Zé Geraldo, Renato e Seus Blue Caps e outros grandes nomes da boa música do Brasil. Além disso, sou da mesma geração de Renato Russo, Cazuza, Tony Bellotto e outros poetas que, até hoje, marcam a memória daqueles que apreciam o ritmo, a melodia, a harmonia e a poesia de qualidade. Sendo assim, Pipokinha não terá nenhuma chance de me encontrar nesse espetáculo de baixíssimo nível, porque não vou contribuir para emburrecer a cidade. O problema é que esse tipo de evento, é considerado pelas pessoas que organizam como um espetáculo que “dá dinheiro”. E não cabe tentar dizer que a apresentação de Pipokinha não é cultura. É, sim! A rigor, não vejo nenhuma diferença entre Pipokinha e os chamados astros do mundo gospel, no sentido de fazer eventos apenas para ganhar dinheiro. Pipokinha vende a burrice, a baixaria, a falta de inteligência a música de uma nota só e a apologia às drogas. O pessoal gospel vende a bíblia, vende Jesus Cristo, vende a ilusão, vende o paraíso, a poesia pobre e outros produtos. Tudo para ganhar dinheiro…
O problema de Cacoal é que essa moça teve apresentações canceladas em diversos outros municípios de Rondônia, sob o argumento de que seu trabalho deprecia a moral, a família e os bons costumes. Então, fica a dúvida em relação à aceitação do evento na cidade mais conservadora do estado. Todavia, após a eleição de 2022, muitas pessoas que ostentavam nos vidros de carros a mensagem “Deus, Pátria e Família” já retiraram os adesivos e voltaram a viver apenas a cultura e os valores morais das redes sociais. Então, tudo indica que o dia 08 de julho será um dia de muito lazer e entretenimento, porque dificilmente os conservadores obedianos vão conseguir segurar a juventude e até as pessoas de outras faixas etárias. A expectativa é um evento lotado! Em Cacoal, até nas festas de formatura de cursos universitários, a pauta musical são os MC’s, inclusive Pipokinha. Assim, não há razão plausível para imaginar que a cidade não vai aderir ao espetáculo. De minha parte, vou ficar na torcida para que os organizadores ganhem muito dinheiro e para que todos os presentes consigam fotos e autógrafos com a Pipokinha, enquanto eu ficarei em casa, ouvindo “Pétalas”, do Djavan; A Força do Amor, de Roupa Nova; Sonho de Caminhoneiro, de Milionário e José Rico; Que País é Esse, de Renato Russo; e Brasil, de Cazuza…
Essa semana, foram divulgadas algumas notas de repúdio na cidade contra a MC Pipokinha. Algumas delas de autoridades políticas, outras de igrejas e associações… Será que isso segura o ímpeto cacoalense para ver a Pipokinha? No caso das instituições católicas que divulgaram nota de repúdio contra a MC que prega a baixaria total, talvez fosse bem interessante avaliar a possibilidade de trazer a Cacoal o Padre Zezinho. Eu confesso que pagaria o dobro do valor do ingresso de Pipokinha para ir ao show do Padre Zezinho e vê-lo cantar Utopia, Oração Pela Família, Um Certo Galileu, Se Jesus Chegasse Agora e outras belíssimas e emocionantes canções que ele fez para pregar a paz, a harmonia e o amor. Eu respeito as divergências, mas nunca vi nenhum cantor do mundo religioso mais talentoso para a poesia, e alguns deles não vão além de refrãos surrados que jamais terão a qualidade da suavidade de Zezinho. Aliás, Utopia é de 1975, mas tem uma poesia que é absolutamente atual. E belíssima!!
Isto posto, quero registrar que não me oponho a nenhuma contratação de artistas e nem sei quem são os organizadores desses eventos, porque nunca fui aos shows realizados em Nossa Urbe Obediana, mas sou obrigado e engrossar o coro de que Pipokinha serve apenas para aumentar o saldo bancário dela e de seus contratantes, mas produz somente a baixaria e a depreciação da cultura musical brasileira. E, neste caso, faço absoluta questão de me incluir entre os conservadores obedianos, não para ajudar ostentar os adesivos que sumiram dos vidros dos carros, mas para deixar bem claro que estou habituado a conservar todos os grandes poetas da arte brasileira, porque uma pessoa acostumada a ouvir Djavan tem o dever de abominar as pipokinhas… Tenho dito!!!
FRANCISCO XAVIER GOMES – Professor da Rede Estadual e Jornalista