Manaus/Am – A previsão de que a 7ª pior vazante do último século, registrada em 2005, na Amazônia, poderia causar fortes impactos no sistema ambiental da região foi invalidada por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA) e da Companhia de Pesquisa em Recursos Minerais (CPRM/Am).
Estudos feitos pelos técnicos no mês passado indicaram que as mais de 150 toneladas de peixes mortos na seca não irão prejudicar a reprodução pesqueira. A possibilidade de haver uma enchente nas mesmas proporções em 2006, também foi descartada pelos especialistas.
Na primeira quinzena de outubro (período da vazante), profissionais do meio ambiente como o diretor de Fauna e Recursos Pesqueiros do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama), Rômulo Melo, preveu que haveria uma diminuição significativa na quantidade de peixes para o próximo ano, devido aos impactos ambientais gerados pela seca.
"A recuperação das águas, depois da vazante, será lenta, dificultando a migração dos peixes das águas paradas para a reprodução nos grandes rios (época da piracema). Ou seja, além dos peixes que já morreram com a diminuição das águas nos igarapés e lagos, milhares de espécies migradoras podem perecer no percurso do rio Amazonas", ressaltou Melo.
A mesma idéia defendia o secretário executivo de Pesca e Agricultura de Produção Rural (Sepror), Geraldo Bernadino. "Nessa vazante os igarapés e lagos diminuíram pelo menos 10 metros de altura. Esse fato pode prejudicar a produção pesqueira daqui a três anos. Isso aconteceria, porque os milhares de herbívoros e carnívoros mortos estariam se reproduzindo agora durante o mês de novembro", explicou.
Durante o período latente da seca (setembro a outubro), estatísticas realizadas pelo Ibama em parceria com a Sepror confirmaram a morte de mais de 150 toneladas de peixes, residentes em paranás, igarapés e lagos. De acordo com Bernadino, esses foram os locais mais afetados com a vazante, devido a obstrução dos canais fluviais por blocos de areias, gerados com a diminuição das águas.
Peixes terão reprodução normal
Os pesquisadores Pedro Mera, Hiroshi Noda e Sidinéia Amadio, coordenados pelo agrônomo com especialização em Biologia Aquática, Roseval Leite, do INPA estiveram nos municípios de Manaquiri, Careiro da Várzea e Manacapuru (Am), após o término da seca (27/10) e invalidaram as suposições de impacto ambiental no setor pesqueiro.
"Peixes residentes em grandes lagos como, curimatá, pescada, sardinha, piranha e tambaqui, não serão prejudicados durante o período da piracema (época de reprodução dos peixes), devido ao processo natural de renovação das águas", garantiu Roseval.
Segundo o coordenador da expedição, restos das carnes dos peixes mortos que não foram absorvidos pelas bactérias se transformarão em grandes fontes de nutrientes para as terras que, juntamente com a chuva, gerará a reprodução em massa de algas, principal alimento dos peixes herbívoros.
A possível diminuição das espécies carnívoras residentes dos lagos que morreram e não poderiam se multiplicar na piracema é contestada por Roseval. "Com o retorno das chuvas os lagos trocarão suas águas. Por isso as espécies de outros lagos não afetados estarão migrando para as regiões abaladas com a vazante. Esse fenômeno natural contribuirá para a reprodução dos carnívoros nas grandes redes fluviais, entre elas Amazonas, Solimões e rio Negro", observou.
Hidrologia e clima não serão afetados
De acordo com o gerente de hidrologia da CPRM, o hidrólogo Marco Oliveira, não existe indícios históricos de que a vazante registrada neste ano, possibilite um desequilíbrio hidrológico no setor fluvial da Amazônia no próximo ano.
Oliveira informou que a maior seca, registrada em 1963, onde as águas dos rios ficaram na marca dos 13,64 metros, não influenciou na cheia do ano posterior. "Em nosso sistema, 1964 foi tido como um ano normal de cheia", explica.
A mesma situação aconteceu com a segunda maior seca, em 1906, com 14,20 m e a terceira em 1997, que registrou uma marca de 14,35m de altura nos rios. A vazante de 2005 foi a sétima maior dos últimos 100 anos, onde encerrou o período de seca com 14,75 metros em 27 de outubro.
“Não temos motivos para acreditar em desequilíbrios hidrológicos no sistema fluvial da Amazônia no próximo ano com um suposto aumento descontrolado da marca dos rios", declara.
O hidrólogo ressaltou ainda que o curso dos rios vem subindo normalmente nos últimos 55 dias, com médias que chegavam a mais de nove centímetros por dia. "Atualmente (20/12/05) o rio aponta uma marca de 20,01m. Isso significa que ele já subiu cerca de 5,35 metros, normal nessa época do ano", comentou.
O setor climático da região amazônica também não sofrerá influências da última estiagem, como afirma o diretor do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet/Am), Flávio Natal. Segundo ele, as precipitações (chuvas) registradas nos últimos 40 dias em toda a região estão acontecendo dentro da média estimada pelo instituto.
"Estamos registrando uma queda de pelo menos 90 milímetros por dia. Em alguns casos ultrapassam os 120 mm, mas é em fevereiro que o processo de precipitação começa a aumentar. Além do mais, não existem fatores científicos que comprovem que um verão muito forte possa interferir no curso normal do inverno amazônico", declarou.
Águas já estão navegáveis
Os municípios que ficaram isolados pela seca, devido ao impossível acesso por meio de barcos, agora já podem ver chegar as embarcações em seus portos. Cidades como Manaquiri e Careiro da Várzea, no Amazonas, já estão com seu nível de água transitável.
"Não agüentávamos mais tanto sofrimento: falta de comida, de água potável, além é claro do isolamento que não nos permitia sairmos da área", informou o presidente da comunidade Santa Marta, localizada no Manaquiri.
As doenças também foram incidentes no período que decorreu a vazante. "Quando as águas baixavam, se criavam vários buracos no que restava dos igarapés, que serviam de focos para mosquitos infecciosos como dengue e malária, mas agora já podemos ver nossos paranás enchendo. Isso é grandioso, para quem viveu profundamente a seca ", declarou o líder do distrito de Purari, no Careiro da Várzea.
De acordo com comandantes dos barcos ancorados no porto de Manaus (Am), todos os rios da Amazônia já estão transitáveis desde o último dia 29 de novembro. "Rios como o Madeira, o Solimões e o Rio Negro não oferecem mais dificuldades de navegabilidade em nenhuma região", afirmou Almir Silva, dono de embarcação.