No mínimo 50% dos índios de Rondônia pertencem a uma ou a outra congregação religiosa. Na Reserva Indígena Suruí, localizada a 500 quilômetros de Porto Velho, Capital do Estado, metade dos moradores já foi evangelizada por pastores brasileiros e estrangeiros. Um evangelizador americano já estaria inclusive traduzindo o novo testamento para a língua tupi-mondé.
O assunto divide opinião nas aldeias. O cacique Mupirí Suruí disse que a evangelização existe desde a época em que os brancos começaram a manter contato com os índios, mas que tem aumentado muito nos últimos cinco anos. Ele informou que recentemente teve que permitir a construção de uma igreja na aldeia, para evitar desentendimentos entre os índios. A partir daí decidiu deixar que cada um decidisse por seguir ou não uma religião.
O cacique Almir Suruí disse que a desvantagem da evangelização é o impacto causado na cultura indígena. Segundo ele, a influência da igreja fez com que ocorressem muitas mudanças na aldeia. Deixaram de ser realizadas várias manifestações culturais como danças, festas e casamentos tradicionais.
A índia Diná Suruí é uma das que defendem a evangelização. Ela dá continuidade ao trabalho dos pastores, ensinando as crianças da aldeia. Na opinião de Diná, a religião não prejudica a cultura dos índios, mas sim orienta-os para que deixem de beber, de matar e de fazer outras coisas ruins. “A bíblia diz que só no caminho de Deus é que teremos a vida eterna”, disse.
Índio vira pastor
O evangelizador da Igreja Batista, Jadir Almeida, que atuou nas aldeias dos Suruís durante quatro anos, disse que o trabalho é realizado recomendando a preservação da cultura indígena. Jadir explicou que evangelizava com a ajuda de dois índios, que faziam a tradução dos textos bíblicos. Uma das aldeias chegou até mesmo a criar um coral.
Jadir informou também, que há cinco anos, quando começou a atuar nas aldeias indígenas, um pastor americano já evangelizava os Suruís há cerca de 15. “Sempre recomendei a preservação da cultura. Explicava que a bíblia dizia que o homem devia ter apenas uma mulher, não matar e não beber, mas eu não pressionava, deixava que eles decidissem”, disse.
Segundo Jadir, um jovem chamado Chico Epab Suruí teria ficado tão influenciado com a evangelização, que resolveu ser pastor e com a autorização da Fundação Nacional do Índio (Funai), frequentou o curso de Teologia, com o patrocínio da igreja. O jovem terminou a faculdade no final de 2004 e voltou para a sua aldeia, porém não conseguiu se readaptar.“A igreja ainda quer fazer uma proposta para o Chico Epab, para ver se ele vem morar na cidade e trabalhar a evangelização dos índios nas aldeias”, disse.
Impacto na cultura
A indigenista Maria do Carmo Barcelos, disse que começou a conviver com os Suruís em 1976, pouco tempo depois de serem contatados e que naquela época, os índios ainda preservavam seus costumes. Segundo ela, é desrespeitoso qualquer pessoa chegar e tentar impor uma religião, o que, em sua opinião, está acontecendo com os Suruís. “A vida dos índios é explicada através de mitos, com uma ligação muito forte com o espírito. Por isso é fácil chegar com uma mensagem espiritual e confundi-los”, disse.
Segundo a indigenista, com a penetração da religião, os costumes indígenas vão ficando esquecidos. “O pajesismo, por exemplo, praticamente não existe mais nas aldeias”, disse.Um ponto positivo da religião, conforme a indigenista, é a contribuição para que os jovens se afastem das bebidas, porém, ela acredita que existam alternativas para desenvolver outro tipo de trabalho de conscientização. “A caracterização física e os rituais já estão se acabando e se as coisas continuarem assim, toda a cultura dos Suruís será extinta”, disse.