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quarta-feira, dezembro 18, 2024

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“Juízes que não ficam” – o nó que preocupa o professor de Direito aposentado Pedro Origa Neto

Professor concursado da Fundação Universidade Federal de Rondônia (Unir), Pedro Origa Neto, 76 anos, lecionou Direito e ali aposentou-se com R$ 2,3 mil por mês. “Saí no primeiro semestre após a chegada do celular em sala de aula.”  Desistiu porque notou que seu ensinamento não teria a mesma eficácia de anteriormente e o uso do aparelho se tornou irreversível, a qualquer hora, mesmo dentro da sala de aula. Esta é a segunda parte da entrevista de Origa para a série OAB, 50 ANOS.


Corria o ano de 1981, advento do novo estado. Aos 34 anos, Origa presidia pela primeira vez a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil. Foi procurador-geral do estado, assustando políticos ou apadrinhados acostumados ao tradicional e abusado “toma lá, dá cá.”

Ao comentar sua aposentadoria, ele dá a entender que “nem tudo é ruim no Ensino Público.” “Felizmente há compensações, e elas dão alegria”, resume. Assim, o advogado e ex-professor iniciou um levantamento para saber onde estavam seus ex-alunos, e aí se deu por satisfeito: “Alguns são juízes, outros, promotores.” Conforme avalia, o Curso de Direito na Unir “conseguiu influenciar a vida e a conduta de cada um.”

“Se o perfil (dos ex-alunos) fosse o de pessoa despreocupada com a sociedade, não haveria dissertações de meio ambiente, nem de sistema prisional”, justifica.

Em seus mandatos, Origa promoveu eventos notáveis com a participação de ex-presidentes da OAB. “Um período pós-Constituição, de Rondônia também.

Pedro fala:

 

“Quando procurador, arguiu várias inconstitucionalidades, entre elas, a do aumento do número de desembargadores, e a anistia do Iperon (Instituto de Previdência de Rondônia). E lutou incansavelmente durante o Governo Oswaldo Piana Filho para a criação da Defensoria Pública.

“NA OAB tive boas, poucas, porém, atuantes Comissões de Prerrogativas e de Direitos Humanos, entregue ao advogado Ernandes Segismundo, durante um encontro no (extinto) Café Santos, na Avenida 7 de Setembro”, comemora.

Hoje Origa combate “a polarização nojenta de direita e esquerda que desanima, porque precisamos de uma justiça que resolva os conflitos, e sem inventar a ‘desjudicialização’, ela serve mais a solucionar o que as empresas aéreas têm feito com a população. Assim, ele propõe a eleição de prioridades: “O que a OAB de Rondônia quer?”

Lembra emocionado a entrega do pedido de impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Melo, por jovens advogados, “sem precisar quebrar nada, de maneira educada.”

Pedro Origa Neto deixou a UNIR quando o telefone celular chegou à sala de aula

Cauteloso, ele critica “essa atual desjudicialização”, entendendo não ser aquilo que se submete ao Poder Judiciário para a solução de problemas. “O ministro Flávio Dino (STF) já respondeu: grande parte dessas ações são movidas pelos partidos políticos. Quem edita as leis, na qualidade de representantes do povo? São eles, então é preciso mais cuidado ao elaborá-las.”

Lembra a contribuição rondoniense para a redação do Estatuto da Advocacia e da OAB e o debate a respeito do mandato de dois anos. “Nos meus foram dois, no Acre, o Aderbal ia, ia, ia…nossa exceção aqui foi o Heitor Lopes, só ele. Mudamos para três anos sem direito à reeleição.”

 

Aprovados “vazam”

Jornal O Guaporé informa a respeito do concurso para juízes em Rondônia

A designação de juízes preocupa o ex-presidente Origa. No mais recente concurso em Porto Velho, mais de 20 aprovados teriam ido embora. “Candidatos de fora que vêm a Porto Velho fazer o concurso e não ficam aqui; em nossa época não era assim. Para piorar, a OAB nacional não fala um “a” sobre os problemas que nós enfrentamos”, queixa-se.

Origa conhece o tamanho do problema desde o século passado: em abril de 1981 ele recebia um telefonema da direção do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios noticiando o sancionamento da Lei nº 6891 (de 30 de março) autorizando a realização de concursos para provimento de cargos existentes.

“Medida altamente benéfica, pois permitirá a efetivação de provas nas capitais territoriais (Boa Vista, Macapá e Porto Velho), com acesso de pessoas ligadas à problemática regional”, frisava o ex-presidente.

Ou seja, a lógica do antigo discurso permaneceu viva ao longo do tempo: se antes, ter juízes suficientes era loteria, hoje a OAB vê passar ao lago a esnobação dos aprovados, com raras exceções.

 

Trinta anos do Estatuto

No dia 4 de julho deste 2024, o Conselho Federal celebrou os 30 anos do Estatuto da Advocacia e da OAB, instituído pela Lei 8.906/1994.

“A promulgação desse estatuto (Lei nº 8906/1994) em um período de redemocratização do Brasil, após anos de regime militar, estabeleceu um conjunto de normas que garantiram maior autonomia e respeito à profissão de advogado, refletindo a importância deste profissional na defesa dos direitos e garantias individuais e coletivos”, escreveu a conselheira estadual e Ouvidora da Mulher, advogada Iarlei de Jesus Ribeiro.

Ela lembrou que essa Lei se constitui “o pilar essencial para a advocacia e para a sociedade brasileira.”  “O estatuto não só fortaleceu a profissão, mas também assegurou a proteção das prerrogativas dos advogados, fundamentais para o exercício pleno da defesa de seus constituintes.”

“Especificamente em Rondônia, a OAB tem desempenhado um papel ativo na promoção de políticas públicas e na defesa de direitos fundamentais, influenciando positivamente diversas áreas, como a educação, a saúde e os direitos humanos”, assinalou Iarlei Ribeiro.
Acrescentando: “Celebrar os 30 anos do Estatuto da Advocacia e da OAB junto com os 50 anos da OABRO é também uma oportunidade para refletir sobre os desafios futuros. A advocacia precisa continuar evoluindo para acompanhar as mudanças sociais, tecnológicas e jurídicas, mantendo-se firme na defesa da justiça e dos direitos dos cidadãos.”

Iarlei Ribeiro, Ouvidora da Mulher: estatuto é o pilar essencial para a democracia

____
*Desjudicialização:

No site Migalhas, o advogado Jean Karlo Woiciechoski Mallmann, especialista em Direito Notarial e Registral, Constitucional, Tributário e Processual Civil, explica essa terminologia:

  • Incorporou-se em nosso léxico o termo “desjudicialização”, como sinônimo de demanda, ação ou procedimento que outrora somente poderia ser resolvido ou presidido pelo Poder Judiciário, mas que, atualmente, pode ser resolvido de forma alternativa, sem a participação da Justiça.
  • A Meta nº 9 para o Poder Judiciário, expedida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e aprovada para os anos de 2020 e 2021, por exemplo, estabelece que os Tribunais devem “realizar ações de prevenção e desjudicialização de litígios […]”. De acordo com o glossário da Meta, desjudicializar significa “reverter a judicialização excessiva a partir da prevenção, localizando a origem do problema e encontrando soluções pacíficas por meio de técnicas de conciliação ou mediação com atores do sistema de justiça, sem que cause impacto no acesso à justiça. A palavra desjudicialização tem natureza qualitativa e não quantitativa”.1          
  • O chamado fenômeno da “desjudicialização” é, pois, a solução que visa promover a resolução de conflitos sem que haja a compulsoriedade do ingresso de ação perante a esfera judicial, já tão sobrecarregada.
  • Esse fenômeno pode ser visto na utilização de métodos alternativos de solução de conflitos (mediação, conciliação e arbitragem) e na transformação de procedimentos exclusivos do Poder Judiciário em procedimentos judiciais facultativos, como sói ocorrer com diversos procedimentos que podem ter seu direito integrado no âmbito das serventias extrajudiciais (tabelionatos e registros públicos).
  • Ocorre que, em qualquer caso, o que temos não é a extinção do poder do Estado-Juiz de resolver certas demandas, o que, inclusive seria inconstitucional, em face do princípio da inafastabilidade do poder jurisdicional, que estabelece que “nenhuma lesão ou ameaça a direito será excluída do Poder Judiciário” (art. 5°, XXXV, CF).

____

Edição de vídeo: Raíssa Dourado
Fotos: Arquivo Pedro Origa Neto, Reprodução O Guaporé, e Raíssa Dourado

 

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